Suponhamos que eu vá para o hospital, tenho uma cirurgia de alto risco e posso não sair viva de lá. Suponhamos que tenho uma doença incurável e que a cirurgia pouco ou nada vai aumentar meus dias de vida. O que faria antes de ir ao hospital? Rezaria um Pai Nosso, se confessaria com um padre, faria um reforço com seu orixá, uma intervenção pela religião kardecista, reservaria um ataúde moderno e colorido, beijaria seus bichos, faria sexo, compraria roupas novas, um carro do ano, comeria na confeitaria Maomé, a mais gostosa de Porto Alegre?
Também poderia meditar, sentar na beira da praia e olhar indefinidamente o mar, sem pensar em nada, de joelhos pediria perdão por todos os pecados conhecidos e desconhecidos? O que, meu Deus, faria se seus dias tivessem contados? Faria algo imbecil, brincaria na praça, colheria flores do campo?
Quer saber o que eu faria? faxina na casa, limparia até os azulejos da cozinha, o banheiro, cortaria a grama, daria comida aos pássaros e arrumaria o guarda-roupa. Cansada, tossindo, meio tonta devido à doença mortal, tomaria uma ducha bem quente, passaria óleo no corpo e depois tomaria uma aspirina junto com um Rivotril. Afinal, amanhã de manhã bem cedo o mundo pode acabar. Assim, morreria sem ansiedade, sem dor e com a sensação de dever cumprido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário