domingo, 8 de maio de 2011

Já passa do tempo de enterrar os mortos

Uma vez, no meio do caminho, conheci um xamã. Adorável, parecia um viking que, segundo ele, tinha sido mesmo em outras vidas. Gordo, muito louro e com muita sabedoria; jovem, por volta dos quarenta. Contei a ele minha dificuldade em enterrar meus bebês mortos prematuramente. Propôs um trabalho xamânico exclusivo para essa dor que não passava. Pensei na sua proposta. Fui a seu escritório para planejar as datas das sessões e o pagamento. Algumas semanas se passaram. Organizada em tempo disponível e financeiramente liguei para sua casa a fim de combinar o começo do tratamento proposto.

- Alô, gostaria de falar com Haymar.

A voz ficou muda do outro lado da linha.

- Alô? - insisti.

- Lamento informar, ele faleceu semana passada - era a esposa dele.

- Como assim? - perguntei estarrecida.

- Ele teve um AVC (derrame cerebral)

Sem saber o que dizer, apenas "lamento muito", desliguei o telefone e desabei chorando.

Pronto! Mais um morto que vou precisar enterrar, se conseguir...

O processo do luto, tipicamente plutoniano, é algo difícil de elaborar. Provavelmente meu luto ainda se mantém vivo, doendo a cada instante, toda a semana, por anos e anos a fio. Quero enterrar meus bebês, não lembrar mais nada - não consigo. Talvez Haymar, lá do outro lado, consiga levá-los a passear por praças bonitas, verdejantes e floridas.

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